A segunda de carnaval e a contagem regressiva da folia

A segunda-feira de Carnaval em Salvador carrega aquela sensação agridoce de quem ainda quer curtir intensamente, mas já começa a se despedir da festa. A energia continua no alto, mas a nostalgia já dá sinais de presença. E o carnaval 2025 foi especial: comemoramos os 40 anos do axé music e os 75 do trio elétrico, duas marcas que definem a história dessa festa.

O trio de Armandinho, Dodô e Osmar desfilou na Barra, trazendo uma celebração pura da origem do trio elétrico. É sempre um momento de reverência, um lembrete de que tudo começou ali, em 1950, com a Fobica e a genialidade de Dodô e Osmar. Em um Carnaval onde o futuro do axé sempre se discute, voltar às raízes é essencial para entender a força desse movimento.

No Circuito Osmar, o Campo Grande ferveu com atrações que representam bem a diversidade do Carnaval. A Banda Mel, ícone do axé, mostrou que sua história segue viva. Cláudia Leitte, com sua energia contagiante, provou que tem um dos blocos mais animados da folia. Mas ninguém levou tanto o conceito de mistura como Carlinhos Brown. O cacique do Candeal fez do trio um caldeirão de ritmos, em que o axé se encontrou com timbres afro, samba-reggae e uma pulsação percussiva única. Brown não faz apenas um show, ele entrega um espetáculo ritualístico, uma experiência que transcende a música.

O pagode também teve seu momento. O Pagod’art, o Parangolé e o Psirico garantiram que o pagodão estivesse bem representado, com direito à energia inconfundível do bloco As Muquiranas. E claro, houve também a aguardada pipoca de Igor Kannário, que completou 10 anos este ano. Amar ou odiar, Kannário arrasta uma das maiores multidões do Carnaval, reunindo o povo da periferia que vê nele um símbolo de resistência e representatividade. O “Príncipe do Guetto” mantém seu posto.

No Circuito Dodô, na Barra-Ondina, a festa seguiu grandiosa. Ivete Sangalo entregou mais um desfile de carisma, potência e repertório recheado de sucessos. Bell Marques fez aquele desfile que parece um ritual de felicidade, onde todos sabem as músicas e pulam juntos como se fosse a primeira vez. Durval Lelys e o bloco Me Abraça mantiveram a tradição do axé raiz, enquanto Daniela Mercury, com sua performance sempre teatral e envolvente, reafirmou porque é uma das maiores forças dessa música. Teve ainda Tony Salles com o Parangolé e o ritmo percussivo e hipnotizante da Banda Cortejo Afro, trazendo a espiritualidade e a cultura afro-baiana para a avenida.

A segunda-feira de Carnaval foi um retrato fiel do que é Salvador nessa época: uma cidade pulsante, onde tradição e renovação caminham lado a lado. Se há quem lamente que o axé perdeu força comercialmente, basta passar um dia imerso nessa folia para ver que sua alma continua vibrante. O Carnaval se reinventa, mas sua essência permanece: a explosão de música, cor, suor e alegria que só a Bahia sabe proporcionar.