Projeto de Lei autoriza inclusão da neuromodulação não invasiva (NNI) no SUS: um avanço na saúde pública brasileira, mas com ressalvas

A Comissão de Saúde aprovou recentemente o Projeto de Lei 5376/23, que propõe a inclusão da neuromodulação não invasiva (NNI) na lista de procedimentos oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A NNI é uma técnica que utiliza estímulos elétricos ou magnéticos para tratar diversas condições psiquiátricas e neurológicas, como acidente vascular cerebral (AVC), Parkinson, depressão, esquizofrenia e dores crônicas. A medida pode representar um marco na saúde pública brasileira, ao ampliar o acesso a tratamentos inovadores que reduzem a dependência de medicamentos e procedimentos invasivos, alinhando o país às práticas de saúde internacionalmente reconhecidas.

A expectativa é que a proposta avance nas próximas comissões, recebendo apoio de setores da saúde que veem na NNI uma oportunidade de transformar a qualidade de vida dos pacientes. O tratamento pode proporcionar benefícios clínicos significativos, especialmente para aqueles que enfrentam dificuldades com terapias convencionais. No entanto, a proposta também recebeu críticas e ressalvas de especialistas na área.

O neurocientista Kleber Fialho, CEO do Instituto KF e responsável pela NeuroKonex | Plataforma de Neurociência do Comportamento, pontua que o projeto de lei precisa de ajustes importantes. Fialho é referência em neuromodulação autorregulatória e diagnóstico neuropsicofisiológico e destaca que o projeto, como está, carece de uma sustentação de ganho dos resultados da eletroestimulação. Segundo ele, apenas a estimulação elétrica, sem um diagnóstico adequado e sem o suporte da neuromodulação autorregulatória — um processo que deveria estar sob a supervisão de neuropsicólogos —, pode não alcançar os resultados desejados.

“O que falta nesse projeto de lei é uma discussão que vá além da estimulação elétrica. O primeiro passo deve ser o diagnóstico e o direcionamento do tratamento, e o segundo é a sustentação do resultado, que é alcançada pela neuromodulação autorregulatória. Essas são as lacunas do projeto, e precisamos incluir isso no debate”, argumenta Kleber Fialho.

Além disso, o neurocientista chama a atenção para a necessidade de protocolos diagnósticos claros e bem estabelecidos, que orientem o uso da neuromodulação como uma ferramenta terapêutica eficaz. Essa abordagem integrada pode oferecer um caminho mais promissor para os pacientes, com benefícios sustentáveis ao longo do tempo.

A discussão ocorre em um contexto onde cresce a preocupação com o impacto de fatores ambientais no desenvolvimento cognitivo, especialmente em crianças. Estudos recentes associam o uso excessivo de telas a resultados cognitivos negativos relacionados à atenção e funções executivas. No entanto, a relação entre o tempo de tela, as funções neurais e os resultados cognitivos ainda precisa ser melhor compreendida. A eletroencefalografia (EEG) surge como uma ferramenta promissora para elucidar esses correlatos neurais, ajudando a identificar deficiências cognitivas associadas ao uso de telas.

O projeto de lei, portanto, coloca o Brasil em uma trajetória de inovação na saúde pública, mas ressalta a importância de um debate mais aprofundado para garantir que as práticas adotadas sejam as mais eficazes e seguras para os pacientes. A inclusão da NNI no SUS representa um avanço, mas também exige que o país enfrente os desafios que envolvem sua aplicação de maneira responsável e baseada em evidências científicas.